AUDIENCIA PÚBLICA DA FERROVIA TRANSNORDESTINA NO DIA DA GREVE GERAL
( 02/05/2017 - 18:32:45 )
A preparação e mobilização da população para participar da audiência Pública para licenciamento e implantação da ferrovia Transnordestina no trecho Salgueiro – Porto de Suape, lotes 8 e 9, se fez representar pela formação da Mesa, onde sentaram representantes da Transnordestina e da Superintendência Regional do IBAMA de Pernambuco. Ausentes estavam as autoridades municipais, estaduais e a sociedade civil. Este importante evento para o Estado de Pernambuco e o Nordeste do Brasil não teve por parte do Estado Brasileiro o valor para vida econômica da região, há décadas apregoado como “projeto estruturante”, “modernização das relações econômicas” e outros adjetivos valorativos dados pelas autoridades estatais em implantar um projeto que está orçado, após muitos aditivos contratuais, em mais de onze bilhões de reais.
A quantidade dos presentes no público, surpresa na fala de todos da mesa, em dia de sexta feira, véspera de feriadão, sexta-feira tumultuada com greve geral no Recife e região metropolitana, em que os transporte e comercio paralisados em todo o dia 29 de abril de 2017, mesmo, assim, o auditório do SENAI, na cidade de Cabo de Santo Agostinho – PE, ficou lotado, tendo que fazer um auditório a parte com telão, o que fez atrasar a previsão de iniciar as 19h.
A única mulher presente na mesa coordenou os trabalhos de aprovação do Regimento Interno, explanação sobre fundamentos legais da questão ambiental do EIA/RIMA – Estudos de Impacto Ambientais / Relatório de Impacto no Meio Ambiente e os objetivos e meios de funcionamento da Conferencia. Sendo este último distribuído o tempo em apresentação do IBAMA, exposição da Transnordestina sobre o projeto, seus impactos positivos e negativos sobre a realidade ambiental, econômica e social da área por onde será implantada. Logo após, a distribuição de um lanche composto de suco, sanduíche, bolinho e maçã, simultaneamente, em que em formulário pré-elaborado os participantes se escreviam para fazer suas perguntas que podiam ser oral ou escrita.
A “plateia”, entre aspas porque não se resumiu a bater palmas, composta em sua maioria por agricultores familiares dos municípios atingidos na mata sul de Pernambuco com manifestação de faixas com chamada de “A CASA FICA, A LINHA SAI”, “O POVO UNIDO, JAMAIS SERÁ DEMOLIDO”, “DESISTAM DAS AÇÕES JUDICIAIS”, e, muitos cartazes em cartolina, deram o tom de uma posição não esperada pelos patrocinadores de uma Audiência Pública esperada para ser somente aplausos. Foi o que indicou o primeiro participante a falar! O jovem instrutor do SENAI elogiou o projeto da Transnordestina, fez sua pergunta sem muita consequência, porem, não foi seguido pelos demais inscritos. A metodologia do “ping pong”, pergunta alguém da plateia e outro da mesa responde, fez alongar o cansaço de quem fez longa viagem, chegando à noite, enfrentou a BR-101 interditada no intuito de pautar sua aflição, tendo que fazer a viagem de volta.
Ao se ver como meros depositários de ideias alheias, mas que não aceita tal realidade, uma liderança dos atingidos pelos trilhos, utilizando-se do slogan da executora da obra “Um futuro melhor avançar pelos trilhos da Transnordestina”, levantou a mais dura crítica ao projeto da ferrovia que almeja transportar soja, gesso e uva, produtos do agronegócio, afirmando que o futuro dos moradores é ficar sem casas, sem indenizações com os despejos judiciais de demolição de muitas residências dos ali presentes. Sendo seguida por afirmações e perguntas que deixaram os membros da mesa desorientados dando repetidas respostas de que “não se tratava do objeto daquela audiência pública tratar das ações judiciais”, por ser de responsabilidade da outra Transnordestina Logísitica, outra pessoa jurídica e não daquela que realizava a obra. Foi quando um participante, chamado a fazer uso da palavra, solicitou, a coordenadora do evento, a leitura de intimação judicial que a mesma não entendeu, sendo feita a leitura pelo orador, demonstrando que a “outra” Transnordestina estava dando um prazo por mandado judicial de desocupação da moradia em 60 dias, sem nenhuma indenização.
Assim, não encontrando sintonia entre a solução para seus problemas com a proposição do empreendimento da ferrovia, os participantes fazem sua greve saindo do plenário em silencio, deixando-o vazio em menos de 15 minutos. As 23h a delegação de Palmares foi saindo e a coordenação da audiência continuava respondendo as perguntas escritas para uma plenária composta pelos funcionários da Transnordestina, SENAI e IBAMA.
Enfim, essa foi a audiência pública em que os mais de 500 participantes não se encontraram como protagonista de um diálogo, mas na fala de um dos participantes “iria voltar para casa e dizer para os seus filhos que o bicho do trem quer engalobar a todos”. Sobrou ao representante do IBAMA, Superintendente em Pernambuco, o compromisso de fazer gestão com o Ministério Público para discutir a questão das casas. Além disso, nada mais podemos afirmar da conclusão desta Conferencia Pública com vistas a licenciar um empreendimento de tamanha monta para região nordeste e para o País. Contudo, a experiência vivida nesta noite do dia da greve geral, nos permite ser testemunha do que não deve ser uma Conferencia Pública para ouvir a sociedade e a população por meio de sua participação direta sobre as possibilidades de implantação de grandes projetos de impactos ambientais.
Fonte: Lenivaldo Marques da Silva Lima - Sociólogo e Advogado em exercício, membro da Tecendo Cidadania